sábado, fevereiro 18, 2006

Tolice...

Quando se está triste, o mundo parece tão idiota... Não sei ao certo sobre a aplicabilidade dessa teoria, mas pelo menos agora, e todas as outras vezes que eu me pus a uma reflexão intensa, resultando numa profunda tristeza, algo do tipo "que ridículo!" passou pela minha cabeça ou eu a expressei verbalmente. Bem... é simples de se perceber, pelo menos parece.

Depois de alguns minutos pensando, alguma coisa ridícula passa a me atrapalhar. São coisas bestas do tipo, alguém rir perto de mim, um carro passar a toda com o som bem alto, algum gaiato gritar ao longe sobre meu cabelo, enfim, alguma coisa chama parcialmente minha atenção. Idiota, eu diria...

Eu bem sei que algumas coisas vão perdendo o valor com o tempo. É sério... E acho ainda que a tristeza acelera bastante isso, ou pelo menos, acelera o que eu futuramente irei retirar da estante de "coisas importantes da vida".

Ainda me lembro de quando eu venerava o dinheiro. Acho que todo mundo um dia se pegou desejando coisas, algumas até idiotas, sei lá... uma roupa da moda, um celular, ou o que for. Na época qual falo, se não me falha a memória, eu estava desejando um joguinho de botão. Eu tinha alguns cruzados (ou eram cruzeiros) e aqueles brinquedinhos me encantavam demais... Eu já tinha alguns times, mas o dinheiro acabou, sabe como é...

Bem, mamãe saiu pra fazer algo na rua (provavelmente na casa da vizinha), e eu fui caçar alguns níqueis. Na bolsa dela algumas moedas brilhavam pra mim, pequenininho, (acho que devia ter pouco mais de um metro e 10). Com todo o cuidado do mundo, aquele meu primeiro furto resultou em um pouco de felicidade. Teria eu comprado um pouco de felicidade com algumas moedinhas? Bem... Pelo menos posso dizer que fiquei bastante satisfeito com minha, digamos, proeza capitalista.

Mamãe nem se deu conta de que as moedas começavam a sumir, até o dia que ela perguntou quem andava me dando aquele tanto de botões. Daí, a primeira mentira, "achei alguns dinheiros por aí, no chão". E assim, construí minha personalidade... Engraçado, muitas atitudes que tive como criança perduraram muito tempo em mim.

Em algum momento em minha história eu me chateei por causa de dinheiro (já eram reais). Eu queria algo não muito barato no natal e resolveram por me presentear com algo mais caro ainda, mas não tinha nada a ver com o que eu queria. Alguém pede uma bicicleta e recebe uma prancha (???), que situação estranha... Os natais seguintes foram a mesma coisa, todo ano a mesma chateação. Por trás de toda aquela hipocrisia do bom velhinho e da confraternização em família, eu me remoia por não ter um computador, uma bicicleta... Bem... De tantas pancadas periódicas, eu resolvi ter bom senso e mudar um pouco.

Tanto natal como todas essas outras festas que envolvem dinheiro, porque sim, hoje em dia tudo dá dinheiro (até a desgraça dos outros), passaram a ser pura idiotice (pra não dizer hipocrisia) pra mim. Tem um fato recente que eu chamo de carapaudice-moderna... Lembra lá do tsunami lá? Semanas depois, algum ministro de algum país resolveu dizer que "aquilo" era uma grande oportunidade para as corporações se instalarem naquele local.

E quanto à estante, vejo-a cada vez mais vazia. Sim... Acho que da mesma forma que se eu for enumerar o tanto de sonhos que eu tinha antigamente e os que eu tenho hoje... Quer dizer... Eu tenho sonhos? Parando pra pensar um pouco, acho que sonho é uma coisa muito forte. Tenho poucos desejos, estou tão desacreditado que nem ouso em sonhar. O mundo é idiota demais para que eu coloque algo de volta na estante...

E o que me resta nela? Nem eu sei responder. Se não tivesse nada lá, acho que já teria enfiado uma bala na testa, mas não sei, pelo menos agora eu sinto um vazio gigante em minha mente. Pra ser sincero, eu me sinto completamente vazio.

Tirando a teoria do mundo idiota, eu me prendo a outra sobre as pessoas. Andei lendo em alguns lugares, e alguém em algum lugar já havia pensado na mesma coisa. Eu a conheço como "O mundo só tem duas mil pessoas", mas esse alguém resolveu dar um nome filosófico, cheio de "esses" e "ós" e "ís", se não me engano, Solipsismo. É interessante mesmo, e, em parte, soluciona meus problemas com a prateleira e todo o resto dos cômodos. Em resumo, diz que a única coisa que existe, é sua mente, quisá seu corpo. Na teoria das 2000 pessoas, ainda se considerava que existiam mais gente, duas mil, mas os figurantes, no caso, eram meras peças de controle, seres inexistentes que têm como objetivo tornar as coisas aparentemente reais.

No SSSSolipsismo, todos são figurantes, e eu nem tenho a certeza de que o que eu olho segurar um lápis e que aos poucos esboça um texto numa folha faz parte de meu corpo (se é que ele existe). Mas bem, que seja. Eu ainda não acho esse pensamento idiota, quem sabe daqui a algumas horas, sei lá... Mas, como quando eu tinha um metro e dez e me sentia feliz com um jogo de botão, me sinto reconfortado em pensar algo do tipo. Pelo menos eu posso me alegrar em prever que se na melhor das hipóteses tudo isso são apenas peças que simulam a realidade, a verdade é que elas nem existem. Nem mesmo você que está lendo agora isto existe. É frustrante e ao mesmo tempo engraçado.

Foi um professor meu que me falou sobre isso das duas mil pessoas. Bem, será mesmo que ele existe? A parte chata de tudo isso é quando algumas pessoas que eu não me arrependo de ter conhecido serem postas em xeque existencial. Tudo aquilo que eu tive e vivi na infância, todas as músicas que ouvi, as piadas que me foram contadas, os filmes que me fizeram chorar. Será mesmo que tudo isso são apenas frutos de meu subconsciente?

Acho que eu mesmo estou começando a me sentir idiota. Talvez nesse mesmo momento eu esteja sendo tirado da prateleira de alguém, se por algum acaso outra pessoa existir, mas de qualquer maneira esse momento de lucidez ocasionada pela tristeza me foi útil. Depois de tanto tempo a pensar, me sinto normal de novo. Posso sair pela rua e me enganar mais uma vez com as pessoas e com o resto do mundo. Não dar mais importância a algum gaiato que mecha comigo, ao som alto que toca axé no carro de algum playboyzinho, das menininhas que passam de biquíni falando de algum programa de tevê adolescente ou mesmo, de alguém que ainda insiste em deixar o dinheiro na lista de coisas muito importantes na vida. Pra falar a verdade, eu nem ligo mais pra o que pensam. Se realmente nada disso existir, possa ser que um dia eu acorde e me depare com algo mais confortável do que toda essa palhaçada que o ser humano criou para dar à vida um tom de realidade. Se é que pra as coisas parecerem reais, elas têm que parecer idiotas também. Tolice...