sábado, dezembro 13, 2008

Assuntos acadêmicos (só?)

Algo torna a universidade um dos piores lugares qual mantenho relações com pessoas. Em certos momentos uma fantasia estranha mascara isso, e eu repentinamente esqueço o mar de podridão qual eu estou nadando.

Uma coisa boa, fora a absurda fonte de conhecimento, é a capacidade de conhecer pessoas, perspectivas diferentes, idéias novas, tudo que se relaciona com certo engrandecimento do ser e de certa forma, algum amadurecimento.

No entanto, tenho me deparado nestes últimos dois semestres com uma dolorosa constatação do óbvio. Há uma guerra ridícula sendo travada aqui. Não há vencedores, nunca haverá. A única intenção deste joguinho ridículo é a maximização do ego, o sentir-se superior e uma vantajosa dose de egoísmo que vai sendo jogado no ventilador e cada um acaba absorvendo uma fração desta condensada merda.

Os alunos vivem num mundo estranho. A maioria acredita e defende que a universidade é um local onde nos comportamos como soldados. Seu único dever é estudar e mostrar para a sociedade quanto você vale. No caso, pra você valer algo que preste, você deve ter como cifra, pelo menos, um sete. A maioria dos que, por muitos motivos não alcançam esta 'meta' já são pré-rotulados como desleixados, burros, desinteressados, indecisos e uma infinidade de adjetivos, que de longe se percebe que nada têm de positivo.

Fora a questão da nota final em si, tem outros fatores como faltas e prazos. Eu sou muito suspeito pra falar sobre esse assunto, mas minha experiência de vida até agora me fez perceber que algumas coisas são baboseiras absurdas. Prazos e faltas tem pelo menos um pé nisso. Lembro que eu cobrava um amigo meu intensamente sobre isso. Ele nunca fazia os trabalhos em tempo hábil, raramente estudava para as provas entre outros fatores. Ainda assim, eu considerava ele como alguém muito inteligente (o que em na realidade não tem absolutamente nada a ver). O tempo fez eu acabar percebendo que eu estava sendo implicante demais, mas eu achava ele o máximo do desleixo ainda assim. Não demorou muito e ele morreu. A tragédia me fez refletir que porra de cobrança era aquela que todos faziam com ele. Tudo é muito efêmero, existem coisas que numa reflexão mais global não fazem o menor sentido.

No caso das faltas e prazos, eu tenho meu jeito de viver com isso. Por exemplo, eu me sinto muito mais a vontade estudando o assunto em casa do que ficando 4 horas olhando pra alguém explicando algo que eu mesmo posso aprender. Isso foi desde sempre. Eu não consigo me concentrar muito tempo nas aulas, logo começo olhar pra os lados, pra o relógio, e aquele ambiente se torna insuportável. Não é sempre, depende do professor e do assunto (até porque eu participo muito, as vezes até enche o saco), mas certo momento eu acabo me levantando, vou dar uma volta, bebo minha água, faço minhas necessidades fisiológicas e volto.

No entanto, essa conduta minha é meio que geral. Até certo ponto é plausível para a maioria, só que eu , no caso, acabo, para as outras pessoas, exagerando. Não é isso. É maneira pela qual meu ensino-aprendizagem flui. Eu não posso negar o que eu sou e, não posso mais ainda, fingir ser algo que de longe combina com meu jeito de vida. Eu odeio formalidades.

Quer me dar falta, me dê, agora me ouça. É o grande problema aqui. Ou melhor, são. Pouco se ouve, e os que ouvem possuem um problema seríssimo em se colocar no lugar dos outros, talvez por comodismo, convicção ou quem sabe, uma terrível conclusão de que sua maneira de enxergar a conduta das pessoas é a mais plausível, coerente, justa e ética. Como se não bastasse o sistema de notas, no qual meu valor é dado por números, eu tenho ainda que aturar uma cota de presenças de 75%, onde um número menor que isso significa que eu não sou um ser humano apto a ser aprovado em tal disciplina.

'Mas professor, eu já lhe disse. Eu fui bem honesto com você. Eu poderia ter invetado mil desculpas e dito que eu simplesmente fiquei doente. Poderia ter forjado laudos e atestados. Eu simplesmente disse o que aconteceu. Passei por uma cirurgia, tive problema de horário com sua disciplina em relação ao meu trabalho, tive que dar prioridade ao concurso durante um mês e ontem tive que viajar pra realizar o sonho de outras pessoas'

O discurso esmaece no vácuo. Um monólogo prossegue. A figura burocrática autoritária a frente usa os termos 'seu futuro', 'suas escolhas', 'suas prioridades' num tom de verdade absoluta e intencionalidade de culpa. Os argumentos para ele apresentados nada valeram, e 'suas desculpas' foi a forma como ele se referia aos mesmos. Num tom conciliador disse que não tinha intenção de dar nenhuma 'lição de moral' e que o dito aluno deveria 'rever o que estava fazendo com sua história na universidade'. Algumas conseqüências desagradáveis fizeram-no pedir desculpas ao 'mestre' e dizer o 'muito obrigado' mais falso de toda sua vida. A cabeça baixa passa pelo corredor a frente e um sentimento bizarro de fracasso preenche-o completamente.

A universidade é um tremendo fracasso justamente por causa da burocracia e outras coisas. É lógico que muitas pessoas sequer estudam, muito pouco aprendem e realmente não levam a vida em si a sério. Mas observe, tratar a instituição a mãos-de-ferro é a atitude das mais ignorantes. Primeiro porque se desconsidera a sinergia e a dialética, nem todos aprendem e e ensinam da mesma forma, ninguém é igual ao outro, cada ser humano é repleto de particularidades intensas e incomparáveis, pois são teias imensas que não se separam em essência. Como então impor um regime ridículo, movido por pseudos-boas-intenções? Pois em verdade a única finalidade desta merda maior ainda é suprir o mercado de trabalho e formar uma horda de mercado de reserva para os patrões.

E os imbecis entram nas salas, assistem as aulas como se estivessem fazendo a coisas mais certa e justa do mundo. Assistem por obrigação e não por vontade interior. Você pode pensar 'está dizendo isso porque não é você o professor!'. Balela! Eu serei, se tudo der certo, e eu, desde a primeira vez que comecei a dar aula (estágios e outras coisas mais) falei o óbvio. 'Assista minha aula se quiser, se não quiser pode assinar a lista de presença e sair. A única coisa que eu quero dos que ficarem aqui é respeito.'

Esperava mais disto aqui. O tempo passa e a única convicção que eu começo a construir é que eu estou cada vez mais interiorizando valores que não são meus. As vezes acabo para uma aula sem propósito algum pela onda dos outros. As vezes porque é a única coisa a se fazer no dia. Não sei, pode parecer boçalidade, mas eu não troco minhas horas de estudo sozinho por praticamente nenhum professor duas ou quatro vezes na semana numa sala repleta de seres egoístas qual eu não tenho absolutamente nada em comum a não ser o curso e o local onde estou.

Ainda assim, minhas notas vão bem obrigado. O que, incrivelmente não diz nada pra mim. Já passei com 9 em uma disciplina que não aprendi absolutamente nada, e já fui pra final de uma que acredito saber mais do que alguém que passou direto (o que me deixou indiscritivelmente puto!).

Julgar, não julgar, dar valores errados, pré-conceitos e egoísmo estão todos no mesmo barco. O professor não se coloca na pele do aluno, que tem que trabalhar e estudar um bocado. Que não tem a comodidade de um carro pra ir e vir e gastar menos horas no seu dia. Que ainda, não tem empregada em casa e tem que se virar com a comida. Que pode ainda morar sozinho, e seu emprego não é uma escolha e sim, sua única opção. Ainda, desconhece e muitas vezes sequer fica curioso com o motivo da conduta do aluno.

'...não faltei porque quis desta vez. O sonho de outras pessoas dependiam de mim e eu tive que abdicar da aula ontem em prol disso'. A história foi a de um homem que nasceu pra música e também a faculdade o oprimiu. Uma seleção num festival deixou ele entre os 18 colocados de 100. Ele a banda não puderam ir por causa de provas, seminários e aulas de reposição para disciplinas quais se poderia perder por falta...

Ele, todo coração, saiu sozinho pra rodoviária, com um violão e foi se apresentar como solo. Foi para as finais. Todos deram um jeito de ir, e, eu não poderia ser o único a pensar só em mim. Talvez não fosse um egoísmo ter ficado, no entanto, acredito que teria sido um individualismo ruim.

Quando converso com alguém sobre isso. Sobre as faltas, as decisões, a minha maneira de enxergar a realidade eu sou muito crédulo do que digo e sinto. Cada ação que eu faço vale a pena. Cada coisa que eu faço vai refletir no meu futuro de uma maneira que eu sequer sei. Pode ser algo bom, pode ser algo ruim, mas eu quero que seja sempre algo que não me faça ser algo que eu abomino. Não quero ser mais um que bate continência, que é repleto de dogmas e preconceitos, que aceita o prato posto como se tudo fosse muito lindo e muito correto. Não! Está tudo errado sim e eu não vou ser mais mais um a dizer 'não se pode fazer mais nada'.

Desde criança que me dizem que eu iria mudar meu jeito de pensar. Não quero virar meus pais, ou os pais dos outros. 'Apesar de tudo, tudo que vivemos ainda somos os mesmos?' Amadureço, endureço, a ternura sempre perto, mas, jamais, conformado. As conseqüências eu aceito. Minha dignidade, meu eu, o que eu tenho de mais precioso que é a maneira como eu vivo e julgo a vida, trocada por uma comodidade ridícula numa inexistente igualdade é a coisa mais idiota que eu poderia fazer.

O tempo há de passar. Acredito que o mundo não vai durar o suficiente pra eu ser velho o quanto espero, ou que possivelmente morrerei jovem por algum motivo desconhecido. Mas ainda assim acredito que no fundo no fundo, que sejam 10 ou 1 ano, eu vivi do jeito que havia de viver. Não tiro uma vírgula do meu passado. Nenhuma. O que disse, e o que fiz me tornaram quem eu sou hoje e eu estou muito satisfeito (mas não completo). O que fizeram comigo, principalmente as piores coisas, são, pra mim hoje, o meu maior legado. Nos momentos de mais dificuldade eu amadureci e passei a dar valor a coisas que são em essência importantes pra mim. Então, você, não venha me dizer como se vive a vida e nem quantos títulos acadêmicos você tem. Cada um vive a vida da maneira que conseguir, e, até você se colocar no lugar do outro, pra mim, você não passa de algo menos importante do que a menor merda que possa existir neste planeta.